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África: Líder da UA lamenta surgimento de novas guerras, mas está convicto: “a paz definitiva chegará”

Victória Maviluka
25/5/2025
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Foto:
DR

Estadista africano mostra-se perplexo que, com recursos hídricos que dispõe, África não consiga produzir energia para sua industrialização. Lamenta a fuga de jovens para Europa.

O Presidente da República e líder da União Africana (UA) não tem dúvidas de que a instabilidade política que se vive em África tem sido o grande empecilho ao seu desenvolvimento. Num encontro com embaixadores africanos no Brasil, o estadista mostrou-se convicto que, com trabalho árduo, “a paz definitiva chegará a todas” as regiões em conflito.

“O nosso continente enfrenta grandes desafios e gostaria de começar por aquele que acaba por ser o grande entrave ao nosso desenvolvimento, que é a questão da insegurança no continente, a problemática da paz e da segurança no nosso continente”, observou, na reunião realizada neste sábado, 24, em Brasília.

Lamentou que, a apenas cinco anos da data (2030) em que os países africanos deviam silenciar as armas, ao invés de se ver a redução das guerras e dos conflitos armados no continente, o que se tem constatado é o surgimento de novas guerras e novos conflitos.

Há uns anos, recordou João Lourenço, quando se falasse de conflitos em África, olhava-se, sobretudo, para a região do Sahel, “onde foram constituídos grupos terroristas que desestabilizavam os países da região” como a Nigéria, Burkina Faso, Mali, Níger, Tchad, “alegadamente devido à situação em que repentinamente caiu a Líbia”, após a morte de Muammar Kadafi.

“Mas, hoje, quando falamos de insegurança no nosso continente, já não olhamos apenas para o Sahel, ou, se olhamos, não é apenas com a preocupação do terrorismo, mas, também, com a preocupação das mudanças inconstitucionais de regime”, referiu.

Como se não bastasse, observou, outros conflitos ou surgiram ou perduram: “Velhos conflitos, como por exemplo o do Leste da República Democrática do Congo, onde sempre proliferaram forças negativas, mas que acabaram por culminar com o confronto quase directo entre países vizinhos, nomeadamente entre a RDC e o Rwanda”.

Citou outros casos de instabilidade, como no Sudão, Sudão do Sul, Moçambique (Cabo Delgado) e Somália. No entanto, não obstante o recrudescer de conflitos, o presidente em exercício da União Africana disse que os líderes do continente não devem cruzar os braços quanto à busca da paz.

“Vamos trabalhar arduamente, sem desistência, sem pessimismo. Temos de acreditar que a paz definitiva chegará a todas essas regiões (...): ao Sahel, à região dos Grandes Lagos, ao Sudão, ao Corno de África, à SADC, nomeadamente em Moçambique, e, de uma forma geral, em todo o nosso continente”, afirmou o estadista africano.

Desenvolvimento, mesmo com instabilidade

No encontro que manteve, neste sábado, 24, em Brasília, com os embaixadores africanos e da Comunidade do Caribe (CARICOM) colocados no Brasil, o Presidente angolano e líder da UA observou que ao mesmo tempo que os países africanos estiverem a combater os conflitos devem, também, cuidar do desenvolvimento do continente.

“O desenvolvimento há-de acontecer mais facilmente ali onde houver paz. Costuma dizer-se que o capital, o investimento é alérgico ao troar dos canhões, é alérgico ao conflito. Onde há conflito, o dinheiro foge, o capital foge, o investimento não surge”, referiu.

O desenvolvimento, realçou João Lourenço, tem várias facetas, sendo uma das principais, “sem sombra de dúvidas, a necessidade de investirmos mais em infra-estruturas  para garantir esse mesmo desenvolvimento”. Aproveitou para recordar o recém-realizado encontro em Luanda entre a AUDA-NEPAD e a Aliança das Instituições Financeiras de Crédito Africanas.

Descreveu que se tratou de um evento “bastante valioso”, uma vez que se conseguiu, pela primeira vez, juntar, numa única reunião, as diferentes instituições financeiras de crédito africanas, e que saíram de Luanda com a missão de ajudarem a liderança da UA  a mobilizar recursos financeiros para investimentos em infra-estruturas no continente.

João Lourenço falou, igualmente, da mobilidade intra-africana: “A situação ridícula que vivemos hoje, em que o cidadão de um país africano, para se deslocar a outro país africano, não consegue meter-se no seu carro, ou apanhar o autocarro e, por uma auto-estrada, ligar o seu país a outro país, chegar a outro país… Muitas vezes, tem que dar uma volta muito grande, por carência dessas infra-estruturas que deviam ligar os nossos países”.

O estadista africano referiu-se a casos “caricatos em que, para sairmos de um país africano para outro, temos que ir até à Europa e, depois, voltar, temos que ir até Paris ou até Londres e, depois, fazer o regresso para África, para o país africano para onde pretendemos ir”.

E declarou: “Precisamos acabar com isso, precisamos, de facto, de fazer um grande investimento em infra-estruturas que vão facilitar a mobilidade, em infra-estruturas que vão interligar a energia dos vários países africanos”.

João Lourenço e diplomatas africanos em serviço no Brasil

A energia de que África precisa para industrialização

João Lourenço recordou que África é um continente “pouco industrializado, essencialmente agrícola”, e disse o sonho de se tornar uma região industralizada, como a Europa, América e Ásia, não se alcança sem investimentos na energia.

“Paradoxalmente, é o nosso continente que tem os maiores rios, onde poderiam ser construídas ‘ene’ barragens hidroeléctricas para a produção de energia suficiente para o continente e, consequentemente, as linhas de transportação para levar a energia produzida para as zonas de consumo, para os países que necessitam dela, mas a electrificação do nosso continente conhece taxas muito baixas”, lamentou.

O que esta na base deste subexploração? João Lourenço elencou: “Falta-nos capital, recursos, às vezes, falta-nos a visão de o fazermos para que possamos ter a energia suficiente para sonharmos em industrializar o nosso continente, em transformar as nossas matérias primas, acrescentar valor, dar emprego aos nossos cidadãos, aos nossos jovens e, desta forma, evitarmos aquele espectáculo triste que todos os dias vemos os nossos jovens a morrerem no Mediterrâneo à procura do paraíso na Europa, onde na maioria dos casos ou não chegam lá, ou, se chegam, é uma ilusão muito grande, porque o tal paraíso afinal não existe; pelo menos, para eles não existe”.