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Comandante da polícia em Benguela preocupado com a pouca cultura de denúncias

Cláudio Gomes
13/6/2023
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Foto:
Carlos Aguiar

As zonas periurbanas são o "epicentro" da criminalidade concentrando cerca de 80% dos crimes da província de Benguela, informou à Economia & Mercado, Aristófanes dos Santos.

O comandante provincial disse que no geral, Benguela regista actualmente uma média de 15 crimes por dia, cerca de quatro crimes por cada 100.000 habitantes considerando um universo populacional de 2.231. 385 conforme dados do último Recenseamento Geral da População e Habitação de Angola de Maio de 2014.

O comissário da Polícia Nacional fez saber que os cerca de 80% dos crimes registados na zona periurbana ocorrem nas zonas recônditas com mais dificuldades de arruamento, falta de energia eléctrica no período noturno e com problemas da toponímia.

Segundo o oficial superior também designado delegado provincial do Ministério do Interior em Benguela, trata-se de uma criminalidade de rua que mesmo não sendo uma alta criminalidade, incomoda as diferentes estruturas provinciais.

Em sentido contrário, referiu que nestes locais há um maior sentimento de insegurança que nas zonas urbanas onde existem melhores condições de circulação como vias não tão acidentadas, energia eléctrica e arruamentos.

“A situação de segurança pública na província pode ser considerada estável tendo em atenção os dados que chegam ao conhecimento da polícia e acho que esta é uma situação do País de forma geral”, garantiu, realçando que o município de Benguela é o que mais dá “dores de cabeça”, seguindo-se a Catumbela e Lobito.

De acordo com o interlocutor, a criminalidade e os aspectos de segurança pública são avaliados com base em dados concretos colectados mediante denúncias feitas por cidadãos, organizações, e não de forma "empírica ou imaginativa".

“Ora, se nos atermos aos números, assim, desta maneira como me refiro, podemos dizer que a nossa situação não é endémica, aliás, está muito aquém do esperado tendo em atenção os factores e as condições que propiciam a criminalidade sobretudo no Estado de Direito Democrático. Ou seja, não temos muita criminalidade. Temos até défice se podemos assim dizer considerando os números”, frisou.
Aristófanes dos Santos - Delegado e comandante provincial de Benguela

Referindo-se aos números avançados, Aristófanes dos Santos disse que a análise numérica não pode, por si só, deixar as autoridades policiais e políticas “tão descansadas” tendo em contas que existem crimes que são cometidos mas que não chegam ao conhecimento da polícia o que constitui também “um outro problema”.

“Se não há preocupação relativamente aos casos que chegam ao conhecimento, há aqui um problema com os casos que não chegam ao conhecimento. Estes casos podem proporcionar um ambiente de insegurança”, alertou.

Sobre o patrulhamento da polícia nas zonas periurbanas, o comissário garantiu que as forças policiais têm feito ostensivamente nestas zonas lembrando que apesar do problema da segurança ser uma tarefa fundamental do Estado, não deve ser entendida como sendo exclusivamente do Estado sem o apoio do próprio cidadão. "É preciso nos integrarmos todos dentro de um esquema securitário onde cada um tem de fazer a sua parte porque a polícia, por exemplo, não pode substituir as famílias", disse referindo que as famílias "não se podem queixar da ausência polícia" quando elas não têm o controlo e não se preocupam quando os filhos chegam de madrugada em casa, na pose de telemóveis caros e não questionam a proviniência.

Cultura de denúncia

O delegado e comandante provincial da Polícia em Benguela disse que tem havido da parte dos órgãos sobre a sua alçada todo um trabalho no sentido de aproximar mais as forças de segurança à população e vice-versa, mas que o esforço esbarra na pouca cultura de denúncia por parte das famílias.

De acordo com Aristófanes dos Santos, a polícia é um dos últimos elementos quando se avaliam os elementos que concorrem para a criminalidade.

“Os crimes surgem por factores sociais, por um lado quando há situações gravíssimas de instabilidade social, mas por outro lado, também, há teorias da criminalidade que referem que quanto mais desenvolvida a sociedade maior é o crime. Portanto, há essa faca de dois gumes que requer a participação de todos dentro do contexto”, afirmou, sublinhando que a polícia foi criada para combater o crime e não para criar o crime.

Segundo o dirigente, no âmbito da criminalidade de rua, a província "não tem criminosos importados", ou seja, pelo menos para o tipo de criminalidade como roubo, furtos, e outros. “Os criminosos são os nossos filhos e irmãos. Então temos de ser nós a resolver os nossos problemas. Não podemos esperar que outros venham resolver os nossos problemas. Se por exemplo for morador de um determinado bairro e sei que o meu filho ou filho do vizinho for um prevaricador tenho de denunciar essas pessoas”, disse.

Para que a cultura de denúncia seja uma realidade mais vibrante na sociedade, o comissário da polícia entende que é preciso uma melhor preparação dos efectivos. Ou seja, exemplificou, "se eu for para um restaurante e pedir um bife e o bife estiver rijo, claramente não volto àquele restaurante. Isto significa que se for para uma esquadra e pedir socorro e for mal atendido pelo piquete vou criar má imagem da polícia e não volto lá”.

“É o que temos vindo a fazer com as policias aqui na província de Benguela no sentido de dar mais e melhor preparação aos nossos polícias, porque o polícia é o guarda da cidade, é o homem moral, dos bons costumes, é também o homem que lida com tudo”, sublinhou.

No entender de Aristófanes dos Santos, o polícia “não tem inimigos”, “tem adversários” e por isso tem de ter a preparação necessária para perceber como vai enquadrar determinada situação adversa que venha a ocorrer no exercício das suas funções diárias. “O cidadão que circula na via pública, e que por uma ou outra razão está a delinquir, a polícia não o pode considerar como um inimigo. É um elemento que por uma ou outra razão do ponto vista social está desenquadrado, então é preciso que a polícia o ajude no âmbito securitário ou comunitário”, defendeu.

Aristófanes dos Santos tem mais de 35 anos de serviço nos órgãos nacionais de defesa e segurança iniciando a carreira nas ex-FAPLA (Forças Armadas Popular de Libertação de Angola) e mais tarde ingressou no Ministério do Interior onde, entre outras, exerceu funções de director do Gabinete de Estudos, Informação e Análise; director nacional adjunto da Direcção de Ordem Pública do Comando Geral e de director do Gabinete de Comunicação e Imagem da Polícia Nacional e de comandante provincial da Polícia na Lunda-Sul.

O delegado e comandante província da polícia de Benguela é também professor-convidado no Instituto Superior de Ciências Policiais e Criminais “General - Osvaldo de Jesus Serra Van-Dúnem” (ISCPC), onde orienta trabalhos de fim de curso e igualmente professor-convidado do Instituto Politécnico Metropolitano de Angola (IMETRO) no curso de Pós-graduação, entre outras instituições de ensino em Luanda e Benguela. É mestre em Direito. Tem duas pós-graduações sendo uma em Ciências Criminais pela Universidade Autónoma de Lisboa; licenciado em Ciências Policiais e outra em  Direcção Estratégica de Enfrentamento, ambas pelo Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna da Nação Lusófona.

Enquanto docente, publicou quatro livros e prepara-se para trazer à estampa do seu quinto livro intitulado “Videovigilância em Angola - Os aspectos securitários"), a problemática do sistema de videovigilância na segurança pública.

A primeira obra intitula-se "Investigação criminal e publicidade processual” (2019); a segunda, "Segurança pública, legislação essencial” (2020); a terceira, "O uso da força no exercício da função policial”; e quarta, "Código penal anotado para as forças e serviços de segurança” (2021), além de artigos publicadas em revistas científicas.