IFC Markets Live Quotes
Powered by
3
1
PATROCINADO

Insuficiências no ensino confirmam descriminação socioeconómica

Cláudio Gomes
24/3/2022
1
2
Foto:
DR

O ensino primário enfrenta vários desafios que o impedem de responder à procura por um serviço de qualidade, inclusivo e equitativo. A merenda e os materiais escolares "clamam" por atenção.

O recente Relatório Social de Angola 2019/2020 publicado pelo Centro de Estudos e Investigação Científica (CEIC) da Universidade Católica de Angola (UCAN) aponta também a insuficiência de salas de aulas e de professores, bem como a existência de um número elevado de professores sem formação adequada como factores que influenciam as “elevadas taxas de abandono” escolar com “maior tendência para as raparigas”.

Na Constituição da República de Angola (CRA) e na Lei de Base da Educação e Ensino (LBEE), porém, o Estado angolano compromete-se com a promoção ao acesso de todos à alfabetização, ao ensino, à cultura e ao desporto, estimulando a participação dos diversos agentes particulares na sua efectivação, conforme expresso no artigo 79.º da CRA.

Porém, de acordo com análise dos investigadores do CEIC, este desiderato não passa de mera teoria, cuja retorica não vai além dos artigos expressos na Lei magna, pois, não refletem a execução prática do princípio da Universalidade e da Gratuitidade, constitucionalmente salvaguardados. Ao confiar a gratuitidade do ensino fundamental apenas aos alunos que frequentam as instituições públicas de ensino, concluem, a LBSEE “torna-se discriminatória”.

Os subscritores do documento questionarem-se, por isso, se, de facto, o governo “tem sido capaz de cumprir as tarefas fundamentais do Estado” assumidos na CRA e na LBSEE? Para os peritos, se o Estado define a gratuitidade do ensino obrigatório, então, defendem, “não devia confiar essa gratuitidade apenas a algumas instituições ou alguns alunos”.

Argumentam, em sentido contrário, que “a ampliação do financiamento para aqueles que ministram o ensino obrigatório a que são detidas por privados devia ser considerada”. “Este desiderato tanto podia ser materializado financiando directamente as instituições, como através de bolsas dirigidas aos alunos e suas famílias, visando a aquisição do nível fundamental do ensino geral”, recomendaram.

Citado no Relatório Social de Angola 2019/2020, o professor Manuel da Cruz asseverou, referindo-se a realidade portuguesa, que “sendo o ensino obrigatório gratuito, o Estado tem assim a obrigação de subsidiar a educação, tanto ministrada nas escolas oficiais do Estado, como nas escolas particulares.

Para o académico português, “não o fazer, limitando-se a subsidiar as escolas estatais, para além de expressamente ilegal desrespeita a liberdade de criação de escolas, a liberdade de funcionamento do sistema, acabando por apenas tolerar a iniciativa particular na educação”.

Para além disso, tolerar o ensino privado apenas para quem tem possibilidade de pagar propinas, e obrigar quem não as pode pagar a frequentar o ensino estatal, constitui uma inaceitável descriminação socioeconómica, indigna de um Estado democrático, e configura uma grave injustiça social.

Portanto, concluem os investigadores do CEIC, “não basta que a educação seja um direito constitucional consagrado, é necessário que o Estado proporcione as condições materiais para a sua realização”. “É necessário também que se crie um ambiente propício (a começar pela tomada de consciência) para que a família não se isente do seu papel primário e principal educador do Homem e nem que o Estado açambarque e monopolize funções educativas que deveriam ser das famílias, alertam.

O princípio da Universalidade refere que o sistema de Educação e Ensino tem característica universal, pelo que, “todos os indivíduos têm iguais direitos no acesso, na frequência e no sucesso escola nos diversos níveis de ensino, desde que sejam observados os critérios de cada Subsistema de Ensino, assegurando a inclusão social, a igualdade de oportunidades e a equidade, bem como a proibição de qualquer forma de descriminação, conforme o artigo 9.º da LBSEE.

Já o princípio da Gratuitidade refere que a gratuitidade no Sistema de Educação e Ensino traduz-se na isenção de qualquer pagamento el inscrição, assistência às aulas, material escolar e apoio social, dentre o qual a merenda escolar, para todos os indivíduos que frequentam o ensino primário nas Instituições Públicas de Ensino, de acordo com o artigo 11.º da LBSEE.