Segundo o pediatra, ainda “não existe evidências bastante objectivas” que demonstram que “os benefícios de receber a vacina superam os riscos de ocorrência de possíveis efeitos adversos”, além de simplesmente reduzir a “chance” de surgimento de formas graves da doença.
Pós-graduação em Epidemiologia Clínica pelo “Kenya Medical Research Institute – KEMRI”, em 2010, Rosalon Pedro defende a prevalência do “bom senso” no que a administração da vacina em crianças e adolescentes diz respeito, contrariando a perspectiva coerciva adoptada pelo governo em relação ao combate a pandemia.
As vacinas são ou não recomendadas para todas crianças e adolescentes?
A problemática que se assiste actualmente com o advento da vacina contra a Covid-19 para os grupos etários de crianças e adolescentes não nos permite afirmar com firmeza se são ou não recomendadas, pois, os dados disponíveis relativamente aos benefícios da mesma ainda não são tão objectivos, uma vez que a vacina simplesmente reduz a chance de surgimento de formas graves da doença e não impede o estabelecimento da infecção, e nestes grupos etários os casos de graves são raros, e Angola não foge a regra deste perfil epidemiológico.
Há razões para pais e encarregados de educação recearem a administração das mesmas para este grupo atendendo a sensibilidade?
Esta questão diz respeito a segurança da vacina, e quanto isto, o risco de ocorrência de reacções adversas de curto, médio e longo prazo, até o momento, é similar com de outras vacinas que o mercado já administra há mais tempo. Isto é, as reacções adversas que mais se teme com administração da vacina contra a Covid-19, como a miocardite (inflamação da musculatura do coração), reacções alérgicas graves ou mesmo modificações genéticas irreversíveis, são de proporções de ocorrências muito baixas, que também podem ser verificadas noutras vacinas que o mundo já usa faz tempo nestes grupos etários. Podemos destacar a vacina contra o Sarampo e da febre amarela, que também são doenças causadas por vírus. Deste modo, posso mesmo afirmar que as preocupações de segurança com a vacina contra a Covid-19 não diferem das outras vacinas já existentes.
Que comentário se lhe oferece fazer quanto a obrigatoriedade sobre a administração de vacinas em crianças e adolescentes?
Por razões óbvias de ética, estas vacinas não deviam ser de administração obrigatória para os grupos etários das crianças e adolescentes, pois, ainda não existe evidências bastante objectivas que demonstram que os benefícios de receber a vacina superam os riscos de ocorrência de possíveis efeitos adversos que possam surgir a curto, médio e longo prazo.
Acha que se devia privilegiar a concertação, a sensibilização, em detrimento da coerção? Por quê?
Considero que a sensibilização é o melhor caminho para alcançarmos o consentimento informado quando pretendemos “invadir” o corpo de alguém com algum tratamento ou procedimento médico, que supostamente seja para seu benefício. Embora num contexto de pandemia surge o conflito do interesse colectivo versus o interesse individual, o que deve prevalecer é o bom senso tendo em vista a realidade de cada contexto, e nunca privilegiar a coerção, sob pena de violarmos direitos fundamentais que a humanidade já conquistou com muito sacrifício.
Em que medida os estudos científicos e as estatísticas geradas pela Saúde Pública local e internacionais ajudam a tomar decisões com base no contexto local e se evitar a adopção estrita de medidas validadas pelo ocidente?
Apesar de não existirem publicações a nível local que demonstram cientificamente os benefícios, os riscos, a segurança e a necessidade da introdução da vacinação contra Covid-19 em crianças e adolescentes, o boletim diário produzido pelo Ministério da Saúde (MINSA) tem trazido dados que nos permite entender o perfil epidemiológico desta pandemia em Angola. Tendo em conta estes dados, claramente percebe-se que, em média, 95% dos casos notificados são assintomáticos e dos 5% sintomáticos menos de 10% desenvolve a forma grave da doença, e raro são os casos graves que envolvem crianças e adolescentes. Todavia, estes factos adicionados aos estudos desenvolvidos noutras latitudes, permitem-nos tomar decisões consentâneas no que diz respeito a necessidade da vacinação e obrigatoriedade nestes grupos etários.
As classes profissionais de saúde (médicos pediatras e outros) têm sido ouvidas?
A auscultação da classe médica e de outros grupos de profissionais que lidam com a saúde é indispensável e bastante estruturante, pois, são estes que executam as políticas de saúde e lidam directamente com os destinatários. Não ouvi-los, é criar uma fractura bastante desestruturante na cadeia de concepção e realização de qualquer política de saúde, pelo que, o processo de vacinação contra a Covid-19 em crianças e adolescentes não foge a regra. Tenho mesmo de afirmar que em Angola não existe uma cultura governativa em que as decisões políticas resultam de uma prévia auscultação de profissionais e académicos, e deste modo, as classes profissionais de saúde têm um espaço bastante reduzido de intervenção. É só olharmos para o desempenho e estado actual da Ordem dos Médicos de Angola e é só observarmos que a Sociedade Angolana de Pediatria tem estado a margem destas decisões sobre a vacinação de crianças e adolescentes, isto sem esquecer que as universidades nunca foram tidas nem achadas.
Em que medida acções no sentido inverso têm prejudicado a credibilidade do sistema de saúde?
Estas acções em sentido contrário prejudicam acentuadamente a credibilidade do nosso Sistema de Saúde, porque geram falta de sincronismo na dinâmica dos processos e consequentemente maus resultados e perda de confiança por parte dos utentes e dos próprios profissionais. Esta perda de confiança é o factor primordial que põe em causa a credibilidade do nosso Serviço Nacional de Saúde.

%20-%20BAI%20Site%20Agosto%20%20(1).png)













.jpg)