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Verdadeira transformação para Angola? Um “pacto nacional”, sugere António Costa e Silva, angolano que já foi ministro em Portugal

Victória Maviluka
13/11/2025
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Foto:
Carlos Aguiar

António Costa e Silva critica alegada tendência de preparar orçamentos em função das receitas, ignorando aspectos cruciais: “Quais são as prioridades do país? Que país queremos construir?

Nascido no Bié, há 73 anos, António Costa e Silva esteve presente na noite de 11 de Novembro de 1975, no 1.º de Maio (Luanda), na proclamação da Independência Nacional. O antigo integrante dos Comités Amílcar Cabral, que já foi ministro em Portugal, regressou, recentemente, a Angola e, em entrevista à Economia & Mercado, traça um prognóstico para uma “verdadeira transformação” do País: "Um pacto nacional”.

À conversa com os jornalistas Nuno Fernandes e Sebastião Vemba, o engenheiro e docente sugere ‘orçamento zero’ para Angola, que contrarie aquilo a que chama economia rentista ou de enclave. Critica uma tendência de preparar os orçamentos em função das receitas, ignorando um dos aspectos cruciais: “Quais são as prioridades do país? Que país queremos construir? E pensar nisso antes das receitas”.

Entre as prioridades, aponta para a educação, saúde – sectores-chave, como deixa claro –, diversificação da economia, transformação da agricultura, industrialização. Tudo isso, observa António Costa e Silva, traçado através  de um “grande pacto nacional” a adoptar ao nível do sistema político angolano.

“Defendo isso acirradamente: não podemos deixar que a política seja sempre polarizada, fragmentada e transformada num combate sem quartel, porque assim não se faz nada. Se houver um pacto nacional entre os partidos, o Governo e o Parlamento, com três, quatro ou cinco desígnios nacionais a cumprir, poderemos ter uma verdadeira transformação”, assevera.

Defendo isso acirradamente: não podemos deixar que a política seja sempre polarizada, fragmentada e transformada num combate sem quartel, porque assim não se faz nada

O angolano nascido em Catabola identifica duas ‘armadilhas’ quando confrontado com a questão do difícil exercício imposto à gestão das finanças pela dívida pública. Como é que se consegue inverter este quadro?

Respondeu: “Se analisarmos a evolução do país, o país caiu, a meu ver, em duas grandes ‘armadilhas’ ao longo destes 50 anos. A primeira foi a ‘armadilha’ do conflito prolongado, que foi muito difícil, com 26 anos dos 50 anos de independência gastos nesse conflito prolongado. E o conflito prolongado significou um gasto incomensurável dos recursos angolanos”. 

A segunda ‘armadilha’, indica, dá-se quando é alcançada a paz, em 2002, com Angola a atravessar, durante seis anos, um ciclo de crescimento dourado da sua economia: “De 2002 a 2008, a economia cresceu, em média, entre 10% e 11% por ano. E porquê? Porque os preços do petróleo no mercado internacional estiveram sempre a subir. Mas isso, infelizmente, não foi acompanhado de uma gestão adequada da dívida pública”.

Antídoto para dívida pública: fundo de estabilização e renegociação

António Costa e Silva sugere, em entrevista às Conversas E&M – 25 Anos, modelos de subvenções contrários à mentalidade rentista

O ex-ministro da Economia e do Mar de Portugal entre Março de 2022 e Abril de 2024 recorda uma pesquisa do Centro de Estudos e Investigação Científica (CEIC) da Universidade Católica de Angola (UCAN) que calculou que, entre 2002 e 2008, o Estado angolano, com base sobretudo nas receitas petrolíferas, teve uma colecta na ordem dos 260 mil milhões USD.

“E o que é que se fez? Em vez de usar parte desse dinheiro para apostar, desde logo, na diversificação da economia, apoiando outros sectores com políticas contracíclicas adequadas, para o país não viver só do petróleo, o que é um erro dramático, não só não se fez isso, como o país enveredou por contrair mais e mais dívida pública”, observa.

Como antídoto para o imbróglio da dívida pública, avança a criação de um fundo de estabilização e renegociação. E explica-se: “A renegociação é mais aconselhável do que o país ser confrontado com um default, o que seria dramático, como aconteceu em Portugal e noutros países. Angola deve evitar isso a todo o custo, para não agravar o sofrimento das pessoas”.

A renegociação é mais aconselhável do que o país ser confrontado com um default, o que seria dramático, como aconteceu em Portugal e noutros países

Lembra que, entre 2020 e 2023, houve uma quebra do PIB per capita em Angola na ordem dos 3% ao ano, para quem se trata de um quadro que traduz menos riqueza, o aumento da pobreza, “a armadilha em que o Estado angolano se deixou cair com a questão da má gestão da dívida ao longo de muitas décadas”, reforça.

Na entrevista que pode acompanhar na íntegra aqui ou ler na edição 254 da revista E&M, dedicada especialmente aos 50 anos da Independência, e já disponível nas bancas, António Costa e Silva retrata o país que sonhou em ‘75’; sugere modelos de subvenções contrários à mentalidade rentista e conta a experiência vivida na digressão pelo interior do país no seu regresso recente à terra natal.